sexta-feira, 20 de março de 2009

Num banquinho do pelô

Certa feita estava a conversar com um amigo, enquanto esperava a minha condução para voltar a casa. Ele me dizia que tinha se inscrito em um reality shows, desses que aparecem todo fim de ano na televisão. Querendo ganhar algum dinheiro, mas, principalmente fama, o tal do Manuel (não remetam à personagens de piadas portuguesas) tentava de qualquer forma me convencer a também me inscrever.

- Vamos, é simples: primeiro você pela internet preenche o formulário. Você tem internet não é? Se não tiver, lá mesmo no bairro tem uma casa dessas que paga para ter acesso. Daí cadastra teu e-mail e manda uma fita de vídeo.
- Fita de vídeo? Mas para que se eu já vou preencher uma ficha?
- Vai ver que é porque eles querem ver como tu é, ora!
- Então mando uma foto.
- Foto não, foto não serve. Foto você não pode falar, se explicar.
- Mas isso é um programa ou um depoimento? Pra que me explicar?
- Ah! Você parece que não entende! Manda a fita, eles vão ver tua aparência e quem sabe te chamar. Tu até que é simpático. Mas se for mesmo mandar, faz que nem eu; tinge logo os fios. Vi num filme outro dia, o cara pintou o cabelo e fez maior sucesso onde morava. Matou um traficante e ainda se deu de bem!
- Nossa! Nunca vi matar uma pessoa e ainda se dar bem. Só em filme mesmo.
- Que nada rapaz, existe muito disso. Outro dia, deu naquele programa lá, aquele que mostra os casos de polícia. Deu que um cara que, matou o outro e ainda ganhou presentes da vizinhança.

Então eu começo a me perguntar se esse meu amigo, também não seria capaz de matar para conseguir fama. Como aquele rapaz do ônibus 174, no Rio de Janeiro, há algum tempo atrás. Depois de aparecer na televisão, surgiram depoimentos da tia e de algumas vítimas do seqüestro para dizer que Sandro, só teria feito tudo aquilo para ter seus quinze minutos de fama.
Fui para casa pensando no caminho, enquanto ouvia repetidamente todo o processo de inscrição naquele reality show, em como as pessoas buscam cada vez mais serem famosos, ou ter um status favorável perante a sociedade. E não precisa nem ir muito longe, pode ser até mesmo um daqueles líderes de bairro que se sentem prefeitos só por saberem ler um pouco melhor que os demais. Ou então, meninas que são iludidas com o sonho de ganhar o mundo da moda em grandes passarelas e terminam se prostituindo no exterior.

- E então, vai ou não se inscrever?
- Não, acho melhor não. De repente assistir pela tv é mais interessante.
- E vai perder de ganhar um milhão?
- Quem lhe garante que eu ganharia? Isso é competição ou o que?
- Competição, claro. Mas se você consegue entrar, pode fazer um bom jogo e quem sabe ganhar o prêmio. E mesmo que não ganhe, se tu aparece na TV, com essa tua cara já te contratam para a próxima novela...
- Das seis? Por que novela das oito é coisa pra quem tem família artista, o que não é meu caso.
- Aonde?! Já vi muita figura em novela de primeira vez.
- E já viu algum participante desse tal jogo?
- Não, mas...
- Você já viu alguém que conseguiu algum trabalho fixo por mais de um ano?
- Claro que não. Muitos eu nem ouço mais falar! Nem da cara eu lembro.
- Então pra que eu vou perder tanto tempo em inscrição, jogo e depois ser esquecido e trocado pela próxima celebridade?
- Vale que se tu ganhar, pode até ser esquecido, mas não será mais pobre!
- Pode ser, mas será que vale à pena? Isso é uma loteria Manoel, perceba! Não sei o que é pior, matar traficante pra tentar a fama ou, aparecer na televisão...Olha, meu ponto, até amanhã!
- Até, mas se mudar de idéia me ligue, vou com você preencher a ficha lá pela internet!


[ Viviane Nascimento ]